segunda-feira, 25 de outubro de 2010

A Guerra de Tróia

As origens da guerra de Tróia


Um dia, Hécuba, a esposa do rei de Tróia, teve
um sonho pavoroso; ela, que estava grávida e
em breve daria à luz, acordou de repente no
meio da noite. Logo contou a seu marido Príamo o
pesadelo: sonhara que o filho esperado finalmente
parecia querer sair de seu ventre, mas, ao invés de
uma criança, paria uma tocha. O mais inquietante era
que o fogo acabava por se espalhar pela cidade
inteira, consumindo tudo. O rei tentou em vão
acalmá-la e minimizar aqueles terríveis presságios;
por fim, para não restar dúvidas, dirigiu-se a um de
seus filhos, que sabia como ninguém a arte de
interpretar os sonhos. A resposta que os pais
receberam foi uma horrível notícia e um conselho
tétrico:

— Vai nascer uma criança que causará a ruína de
Tróia! Matem-na assim que nascer!

Pode-se imaginar como o prognóstico destruiu a
tranqüilidade de Príamo e de Hécuba. A criança
finalmente nasceu, Páris, um belo menino, robusto e
de traços encantadores. Que cegueira a dos homens!:
contando de acordo com as luas, segundo um velho
costume, levara dez meses o nascimento de Páris,
assim como dez anos levaria o cerco de Tróia,
terminando com o espantoso parto de guerreiros de
um cavalo de madeira!

Mas Hécuba, mãe, não aceitava a idéia de ver
morto aquele filho e conseguiu fazer com que o
menino fosse abandonado no Ida, uma cadeia de
montanhas e bosques onde certamente ele não
poderia sobreviver. Assim, Páris certamente
morreria, para salvação de toda uma cidade, mas de
uma maneira menos chocante para os pais.

De repente, porém, um acaso muda o curso dos
acontecimentos. Naquele mundo em que os homens
sentiam sempre os deuses se manifestando e
participando dos acontecimentos
cotidianos, era
difícil não ver aí mãos
divinas, precipitando a
ação humana para cumprir
um plano arquitetado
nas alturas. Pastores
encontraram a
criança desprotegida e
destinada à morte e a
recolheram e criaram
como se fosse o filho de
um deles. Prodígio inacreditável:
fora salva da
fome graças a uma ursa,
que foi vista a seu lado
amamentando-o...

Com o passar do tempo, aquele menino cresceu
robusto e se tornou um jovem de valor, que defendia
os rebanhos dos pastores contra o ataque dos ladrões
e das feras. Chamaram-no, então, Alexandre, isto é,
em grego, “o protetor dos homens”. E um belo dia o
jovem voltou para Tróia e revelou quem era, para
surpresa de todo mundo, já que os súditos de Príamo
estavam acostumados a participar anualmente dos
jogos que o pai celebrava em memória do filho
supostamente morto quando criança.

Príamo e sua esposa o receberam muito bem e,
esquecidos daquela profecia sinistra, cumularam
Páris de tudo a que tinha direito o filho de um rei.

Não podiam imaginar o que o Destino já havia
tramado durante a permanência de Páris-Alexandre
entre os pastores do Ida!

Nas montanhas, um dia, Páris tivera de assumir o
papel de juiz num dos julgamentos mais difíceis que
e possa conceber. Tudo começou com Éris, a deusa
Discórdia. Era um monstro horrível de ver, com
serpentes ao invés de cabelos, os olhos em brasa e a
roupa ensangüentada. Estava sempre pronta a lançar
deuses contra deuses, homens contra homens, deuses
contra homens, em suma, a infelicitar a vida de
mortais e imortais com suas intrigas. Um dia, durante
as bodas de Peleu e da ninfa Tétis, os futuros pais do
grande Aquiles, a Discórdia, enraivecida por não ter
sido convidada para a festa, lançou entre as deusas
Hera, Palas Atena e Afrodite, uma maçã de ouro, com
uma inscrição: “À mais bela”.

Uma simples frase causou a maior confusão,
especialmente entre as três belíssimas deusas, que
disputavam acirradamente o título de a mais
formosa. Zeus, desejando pôr fim à discussão,
decidiu organizar uma espécie de concurso de beleza
entre as três rivais. Talvez para evitar ciumeiras e
proteções entre os imortais, determinou que o juiz
seria um ser humano, ninguém menos do que o
também formoso pastor Alexandre-Páris! Mas, com
um mortal falível e divindades dispostas a tudo para
satisfazer a vaidade e não macular a reputação,
aquela disputa não seria das mais imparciais... Cada
uma das deusas prometeu algo ao juiz:

— Você reinará sobre toda a rica Ásia, se me
escolher, -  disse Hera, que era casada com o supremo
rei do Olimpo, Zeus.

— Dê-me seu voto e será o mais sábio dos
homens e vencerá todas as batalhas de que participar. -
prometeu, majestosa, Palas Atena, a mais sábia e a
mais guerreira dentre as deusas.

Mas foi a dourada Afrodite, com seu sorriso cheio
de encantos e seus olhos brilhantes, seu doce
perfume e seus gestos delicados, que seduziu o
pastor, tanto mais que prometeu algo equiparável à
maravilha que ele tinha diante de seus olhos:

— A mais bela das mortais, a grega Helena,
mulher de Menelau, compartilhará do seu leito, disse
a deusa do desejo amoroso, sempre doce e amarga ao
mesmo tempo, como costuma ser o amor.

Terminou com a vitória de Afrodite aquele
julgamento, mas não a guerra das deusas nem as suas
conseqüências — pelo contrário, ali Tróia começava
a caminhar para a ruína última e definitiva. O pomo
dourado da Discórdia arruinaria a cidade de Príamo
e levaria a gregos e troianos muitas desgraças,
lágrimas e dores sem conta. As deusas perdedoras,
Hera e Palas Atena, ajudariam, na medida de suas
forças, os inimigos dos troianos na longa guerra entre
exércitos da Europa e da Ásia.

Um dia Páris, acompanhado de um de seus
irmãos, viajou para a cidade de Esparta, pátria de
Menelau, com o objetivo de raptar-lhe a esposa, que
deveria ser sua, segundo a promessa de Afrodite. Foi
recebido com uma hospitalidade digna dos gregos,
numa recepção que unia anfitrião e hóspede em
fortes laços de direitos e deveres mútuos. O marido,
que de nada desconfiava, teve, pouco depois, de
viajar para a ilha de Creta e, acreditando no pacto de
hospitalidade, deixou sua própria esposa encarregada
de tratar bem os troianos.

Helena, diante daquele jovem ainda mais belo por
obra de Afrodite, apaixonou-se e, sabendo dos planos
de Páris, longe de precisar ser levada à força,
resolveu com ele fugir levando seus tesouros. Foi
bem recebida pelo rei Príamo, que não podia
imaginar que desgraça acolhia em seus muros junto
com aquela mulher que a todos encantava. No futuro,
também um cavalo de madeira seria recebido com
alegria e dele nasceria um rastro de destruição e
morte.

Ao saber do que ocorrera, Menelau reclama de
Tróia a esposa, em vão. Furioso e decidido a se
vingar, conclama todos os seus aliados a marchar
contra a cidade, sob o comando de seu irmão
Agamêmnon.

Naquele exército, iam heróis que o mundo jamais
esqueceria: o jovem e impetuoso Aquiles, o arguto
Odisseu, ou Ulisses, tão hábil na ação quanto nas
palavras, e tantos outros. Tróia, também chamada
Ílion, assistiria a dez anos de batalhas em que
combateriam os mais notáveis dentre os gregos e os
troianos, em duelos que tinham muitas vezes alguma
participação divina. Poetas e artistas praticamente do
mundo todo, e em quase todas as épocas,
recordariam inúmeras vezes aquele conflito terrível
entre Europa e Ásia, que até hoje atiça a nossa
imaginação.